Na rota cultural da pesca

No sábado, dia 18 de Setembro, cerca de duas dezenas de pessoas responderam à proposta de percorrer os caminhos da pesca na Nazaré, numa iniciativa integrada nas comemorações do Dia Mundial do Mar, este ano dedicado ao “Marítimo”.

O percurso iniciou-se no Museu Dr. Joaquim Manso, cuja vocação marítima se manifesta nas suas colecções e exposição. Partindo da representação pictórica do mar, numa obra de Maria Lucília Moita, a visita referenciou o papel do mar na evolução histórica e geológica desta região, assim como relembrou a vitalidade económica dos numerosos estaleiros navais que aqui laboravam quando as embarcações em madeira justificavam a faina diária da maioria da população. Os sistemas de orientação e as artes de pesca tradicionais, desde as redes, os anzóis e as armadilhas, foram analisados através dos testemunhos materiais patentes na exposição “Nazaré. Mar, pesca e tradição”.
Joaquim Estrelinha, mais conhecido por “Espadachim”, pescador reformado com cédula marítima desde os 14 anos, explicou detalhadamente o “Mapa de Pesqueiros” da Nazaré, patenteando um conhecimento empírico norteado pela experiência e pela partilha oral de saberes de geração em geração, necessários quando ainda não existiam os sofisticados sistemas de geo-referenciação e detecção das espécies piscatórias.
Na Capitania do Porto da Nazaré, os participantes maravilharam-se perante a possibilidade de visualizarem os primeiros livros de registo das embarcações e dos marítimos. É longo o percurso desta instituição, com presença na Nazaré desde 1895; outrora, a Capitania era um “mundo”, nenhum assunto sobre as pescas era tratado na Nazaré sem passar pelo edifício da Praça Sousa Oliveira. Mas, as suas competências são cada vez mais esvaziadas, perante a sua distribuição por outras entidades entretanto criadas no panorama nacional e europeu das pescas. Por outro lado, dos de 5 mil pescadores de meados do século XX, restam agora apenas cerca de 350 pescadores e 132 embarcações. É a náutica de recreio que tem aumentado significativamente o registo de embarcações nos últimos cinco anos.

Após a visita à pequena Capela de N. Sra. dos Aflitos, donde anualmente ainda saem os andores da procissão do Homem do Mar, o grupo encaminhou-se para o Centro Cultural da Nazaré, espaço da antiga Lota.
Sucedendo a lotas provisórias e a uma primitiva instalação de madeira, este edifício foi inaugurado em 1958, aqui se vendendo diariamente o peixe trazido pelas embarcações, até à construção do Porto de Abrigo nos anos 1980.
José Bruno Vidal, ex-funcionário, descreveu o funcionamento desta lota, através da exibição de filmagens realizadas nos anos anteriores ao seu encerramento e que, agora, através de uma reedição da CMN, são possíveis de visualizar.
Um poema de Maria da Nazaré, declamado pela historiadora Ana Hilário, encerrou a visita a este espaço emblemático, que durante anos marcou a vida dos nazarenos e atraiu turistas nacionais e estrangeiros.
A barca de armação valenciana “Mimosa”, pertencente ao espólio do Museu Dr. Joaquim Manso e exposta no areal, foi o pretexto para uma emotiva narrativa do pescador Joaquim Estrelinha. Memórias de quem, durante toda uma vida, andou no mar e tentou introduzir as mais inovadoras artes de pesca na região, e que hoje lamenta as transformações que os novos ditames económicos trouxeram ao sector, não atraindo as novas gerações.
A tarde terminava a Sul, no Porto da Nazaré, “abrigo” tão esperado pelos pescadores nazarenos e suas famílias, actual ponto de partida e chegada das embarcações e onde também se localizam armazéns de pescadores, a actual Lota (de funcionamento electrónico), armazéns para comerciantes de pescado, associações de pescadores, Clube Naval, serviços de reparação naval e o último estaleiro de um “calafate” tradicional.
Na sede da delegação local do Instituto Portuário e dos Transportes Marítimos, entidade promotora das Comemorações do Dia Mundial do Mar na Nazaré, José Ramalhal acolheu os participantes e apresentou uma exposição fotográfica organizada pelo Clube Naval da Nazaré que alerta para os perigos da poluição dos mares e das praias. A Unidade de Controlo Costeiro da GNR mostrou os seus equipamentos de vigilância diurna e nocturna e, finalmente, o grupo pôde visitar o barco de fiscalização da Marinha “Hidra”.
“Percursos do mar. Na rota cultural da pesca”, através das questões partilhadas entre todos os participantes, resultou numa interessante ocasião para reflectir conjuntamente sobre o lugar ocupado pelo mar na cultura local, desde as suas formas tradicionais até às práticas mais contemporâneas, aproximando gerações e entidades envolvidas na actividade piscatória.
Foi uma iniciativa organizada pelo Museu Dr. Joaquim Manso, com a colaboração da Câmara Municipal da Nazaré (ler notícia), o IPTM – Instituto Portuário e dos Transportes Marítimos, a Capitania do Porto da Nazaré, a Guarda Nacional Republicana, entre outras entidades e particulares.
Na manhã do dia 22 de Setembro, repete em edição orientada para quatro grupos escolares.

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